Novela, profecia e matemática na “teoria do caos”

Eu já disse que, com a idade, a gente vai se tornando profeta. Lendo a notícia sobre esse rapaz que ganhou o chamado ‘Nobel” da matemática, lembrei da novela “Vidas Opostas”, que escrevi em 2006. Comparem a matéria sobre o jovem premiado, no link:

http://g1.globo.com/educacao/noticia/2014/08/pesquisador-brasileiro-ganha-premio-equivalente-nobel-de-matematica.html

com o perfil do meu protagonista, um jovem matemático chamado Miguel, que elaborei oito anos atrás para a sinopse. E mais abaixo uma cena do primeiro capítulo:

“MIGUEL Campobello. Faixa dos 25 anos. De família rica, considerado gênio da matemática, doutorando no exterior e professor universitário. Apaixonado pela pobretona Joana.”

Agora leiam as cenas do primeiro capítulo em que Miguel faz uma palestra sobre a “teoria do caos”, por  coincidência, o assunto em que o  jovem recém-premiado mais se destaca:

“CENA 51. PORTUGAL. UNIVERSIDADE DE COIMBRA. Exterior. Dia.

Tomadas gerais da bela Universidade. Sobre elas, a legenda:

PORTUGAL

UNIVERSIDADE DE COIMBRA

MIGUEL              — (OFF) Como não pretendo abusar ainda mais da paciência de vocês, encerro aqui minha palestra…

CENA 52. PORTUGAL. AUDITÓRIO NA UNIVERSIDADE. Interior. Dia.

MIGUEL está terminando sua palestra para um auditório não repleto. Umas 30 pessoas. Entre elas, claro, sua mãe, ÍSIS, ERÍNIA, MÁRIO, CUNHAL, SENHORA, CIPIÃO e TEODORO. ÍSIS olha para o filho embevecida, orgulhosíssima. Os demais tentam não fazer caras de totais idiotas.

No quadro negro, atrás de Miguel, está escrita a equação de Lorenz e cuidadosamente desenhado o “atrator de Lorenz” . A equação é a seguinte:

(Ver com a pesquisa o desenho) Também pode haver outras equações escritas.

MIGUEL              —… Dentro dos sistemas dinâmicos não lineares, foi assim que trabalhei a teoria ergótica diferenciável, tendo como base a equação de Lorenz. Não sei até que ponto minha tese merece a generosa repercussão que teve. (Sorri) De qualquer forma, é possível que alguma contribuição eu tenha dado para o bater de asas da borboleta. Agradeço ao Departamento de Matemática da Universidade de Coimbra pelo convite para esta palestra e a todos os presentes pela atenção.

A platéia aplaude, discretamente, exceto ÍSIS e ERÍNIA, que batem palmas entusiasticamente. MIGUEL faz um gesto tímido de agradecimento e logo desce do tablado. MÁRIO, puxa-saco, se apressa a ir apertar-lhe a mão. Miguel retribui desdenhosamente e dá atenção a outros professores e alunos que o cercam.

MIGUEL              — (P/os outros) Que acharam?

CENA 53. PORTUGAL. UNIVERSIDADE DE COIMBRA. Exterior. Dia.

MIGUEL, acompanhado de ÍSIS – que lhe agarra o braço, orgulhosa como uma coruja -, enquanto ERÍNIA o segura pelo outro braço, MÁRIO, CUNHAL, SENHORA, CIPIÃO e TEODORO saindo do prédio da Universidade e caminhando em direção aos carros que os esperam.

MÁRIO                 — Miguel, não vou dizer que entendi tudo da sua palestra, mas alguma coisa pesquei. Só aquele negócio da borboleta no final é que… Que diabos você quis dizer com aquilo?

MIGUEL              — (Ri) Se você não achou graça daquela anedota, Mário, é porque não entendeu rigorosamente uma palavra sequer da minha palestra.

MÁRIO                 — (Disfarçando o azedume) É… acho que a matemática pura está acima da minha capacidade.

ERÍNIA                — (Ri) Não fique triste, doutor Mário. Da minha também.

MIGUEL              — Eu estava me referindo ao famoso “efeito borboleta”, uma das condições iniciais da teoria do caos, o assunto em que eu trabalho.

CUNHAL             — Como é isso, meu rapaz?

MIGUEL              — Pela teoria, o bater de asas de uma borboleta na China pode influenciar o curso natural das coisas e ocasionar um furacão em Portugal.

CUNHAL             — Muito interessante.

MIGUEL              — Vamos examinar um exemplo bem familiar. Digamos que um dia um sujeito chamado Cabral saiu daqui de Lisboa para navegar. Um vento casual o levou até a costa de uma terra desconhecida. Lá os portugueses começaram a se misturar com os habitantes do lugar, depois trouxeram os negros da África, vieram imigrantes de outros lugares e foram se misturando cada vez mais e hoje temos um país chamado Brasil, e o povo brasileiro, que ninguém jamais poderia prever que fosse existir e ser como é.

ÍSIS                       — (Brincalhona) Um verdadeiro caos, para fazer jus à teoria.

Eles riem.” teoriadocaos