Entrevista com Marcílio Moraes, roteirista do filme ‘O Crime da Gávea’
“Além da viagem metafísica, o filme é um policial com os elementos clássicos do gênero: o crime, o mistério, o detetive e a investigação que gera outros crimes.”
Dia 9 de março estreia nos cinemas do Rio, São Paulo, Belo Horizonte e Brasília o filme O Crime da Gávea, primeiro longa-metragem de Marcílio Moraes, autor-roteirista de inúmeras novelas (e morador da Gávea), que assina o roteiro, a produção e a direção de finalização. O filme, um drama policial, é baseado em um romance homônimo escrito por Marcílio e lançado em 2003. No elenco, Simone Spoladore, Aline Fanju, Silvio Guindane, Roberto Birindelli, Ricardo Duque, entre outros atores. O filme foi todo rodado na Gávea, e mostra lugares icônicos do bairro, como a Pedra da Gávea, o Jóquei Clube e o Parque da Cidade.
Páginas da Gávea: Em mais de 30 anos de carreira como autor-roteirista, você já escreveu roteiros para diferentes formatos audiovisuais, como novelas, séries e minisséries. E agora estreia no cinema. Por que decidiu ir para a tela grande?
Marcílio Moraes: Foi um percurso que se fez naturalmente. Meu projeto inicial era a literatura, mas foi no teatro que me lancei profissionalmente, na década de setenta. Nessa época, nem pensava em escrever para televisão ou cinema. Na década de oitenta, fui para a TV Globo. Saí de lá em 2002 e resolvi retomar o projeto literário. Escrevi “O Crime da Gávea” e logo em seguida roteirizei o livro para cinema. Mas aí fui chamado de volta para a televisão, pela Record, onde ainda estou, e o projeto do filme teve que esperar. Agora consegui realizá-lo.
Fazer o filme foi uma emoção nova, porque a estética do cinema é outra. Por exemplo, no filme, você trabalha com o silêncio. Para mim, há tanto tempo submetido à tagarelice da televisão, foi um desafio fascinante, e um enorme prazer.
P.G: O Crime da Gávea é adaptado de um romance seu. No filme, além do roteiro, você assina a produção e a direção de finalização. Podemos dizer que esse é, essencialmente, um filme de autor, certo?
M.M.: Depois de terminadas as filmagens, assumi a finalização do filme, junto com meus sócios, a Lúcia e o Eduardo. Apesar de trabalhosa, foi uma experiência muito rica. E a consequência é que eu me tornei presente desde a primeira ideia, desde a concepção, até as últimas decisões de finalização. Neste sentido, acho que se pode dizer que é um filme de autor, autor-roteirista, sem esquecer, claro, o trabalho do André Warwar.
P.G.: Você mora há mais de 20 anos na Gávea, escreveu um livro sobre o bairro e agora essa história vai ser exibida nos cinemas das principais capitais do país. O que te encanta tanto no bairro?
M.M.: Quando comecei a escrever o livro, lembrei o velho Tolstoi e sua célebre frase: se você quer ser universal, trata da tua aldeia. Aí decidi circunscrever a ação aos limites do bairro da Gávea, que era a minha aldeia, naquele momento, e continua sendo. Mas a intenção nunca foi fazer uma crônica da vizinhança ou coisa parecida. Percorri outros caminhos.
Por exemplo, usei a simbologia que o local oferece, a vista do Cristo Redentor, de um lado, e da Pedra da Gávea, do outro. Um ícone cristão e uma esfinge. Então, o filme sugere, através das elucubrações do personagem, que, por trás da história do crime e sua investigação, se trava um confronto entre duas divindades.
Além da viagem metafísica, o filme é um policial com os elementos clássicos do gênero: o crime, o mistério, o detetive, a investigação que gera outros crimes etc, tudo se passando no perímetro contido entre o Hipódromo, o Baixo Gávea, a Rocinha, o Jardim Botânico e a Pedra da Gávea. O material artístico, plástico, humano, dramático, que se pode encontrar nessa área urbana é deslumbrante e universal. Esse aspecto do filme vai ser apreciado em qualquer cidade ou bairro em que o filme seja exibido.