Presidente e “Presidenta”

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Presidente e Presidenta.

Não é que a palavra “presidenta” esteja errada. A língua é um organismo vivo, como o povo que a fala, em permanente modificação, incorporando novos vocábulos a cada momento e pondo outros em desuso. Não fosse assim, se as normas impostas pela gramática e pelos poderosos fossem rígidas, ainda falaríamos Latim. A “última flor do Lácio”, como diz o poeta, não teria brotado. Nem ela nem o resto do jardim neolatino. Aliás, nem o Latim teria sonorizado o Lácio (região central da Itália), ainda nos comunicaríamos através do Hindo-europeu. Ou qualquer coisa anterior a ele.

Se qualquer brasileiro, pelo fato dela ser mulher, cismasse de chamar a mandatária eleita de “presidenta”, embora a palavra jamais tenha tido uso no país, não haveria o menor problema. Cada um usa as palavras que quiser.

Mas se a própria ocupante do cargo, no uso do poder que lhe foi atribuído, decide, baseada num argumento de gênero, forçar o léxico e exigir que a chamem de “presidenta”, aí a situação é diferente. Porque uma decisão presidencial tem efeitos legais que atingem todas as esferas do governo e, por consequência, todos os cidadãos. Para ficar apenas em alguns exemplos, a imprensa oficial foi obrigada a incorporar a palavra; os membros do gabinete e auxiliares também se viram na contingência de usar o novo vocábulo, concordassem ou não. E mais, o efeito se estendeu aos companheiros, asseclas e a todos aqueles que precisavam agradar o poder.

Esta foi uma das decisões com que Dona Dilma dividiu o país. De um lado, ficaram os falantes chapa-branca da língua portuguesa; de outro, os que se recusavam a usar uma palavra que não constava do seu repertório apenas para agradar a poderosa. Instintivamente, os refratários passaram a ver os chapas-brancas como puxa-sacos; e estes a designar aqueles de coxinhas e coisas que tais.

Ou seja, o problema da palavra “presidenta” é que foi imposta de forma arbitrária. Os poderosos não são donos do léxico, não podem tornar obrigatório o uso de vocábulos. Parodiando o velho Castro Alves, a língua é do povo, como o céu é do condor.