Sempre me incomodou essa exigência, ou desejo, da Dilma em ser chamada de ‘presidenta’, alegando que ‘presidente’ seria masculino e ecoaria algum machismo remanescente. A meu ver, isso não faz sentido. Presidente é o que preside, seja homem ou mulher, assim como agente é o que age, regente o que rege, etc. Embora ‘presidenta”seja palavra dicionarizada, o uso sempre foi ‘presidente’, substantivo de dois gêneros.
Manda quem pode e obedece quem tem juízo. Como ela tinha a autoridade do cargo, o uso foi, em parte, instituído e difundido. Em parte porque alguns acataram e outros não. A imprensa privada, por exemplo, manteve o costume e a chama de ‘presidente Dilma’, enquanto a imprensa oficial consagra ‘presidenta Dilma’. A consequência é que hoje o país está dividido entre os que usam o termo chapa branca e os que não, o que cria alguns inconvenientes.
Outro dia, numa entrevista, o novo ministro do Supremo, Luis Roberto Barroso, referiu-se à Dilma como “presidenta”. Imediatamente, apesar de saber que se trata de um jurista dos mais respeitados do país, se formou na minha cabeça a ideia de que o cara é – como dizer de modo que não ofenda? – amigo de quem está no poder, ou, pelo menos, governista.
Pode não ser nada disso e este detalhe não ter qualquer influência nos julgamentos que ele virá a proferir. Mas aí está o perigo do uso autoritário das palavras: elas passam a ter conotação política e a estigmatizar quem as usa.
Fui deitar pensando nisso e sonhei com o mestre Aurélio Buarque de Holanda. Reclamei com ele desse negócio de ‘presidenta’ e ele me respondeu com aquela fina ironia que o caracterizava: Vocês ainda estão com sorte, porque no Brasil a ‘ocupanta’ do cargo preside, se reinasse, se intitularia ‘reinanta’.